No Japão, é comum criarem termos específicos para designar certos desvios de comportamentos dentro da sociedade. Como exemplo, podemos citar o Karoshi, o Soushoku Danshi e o Hikikomori, termos predominantes na sociedade moderna japonesa e que acabaram sendo mundialmente conhecidos.
Este fenômeno que já atinge mais de 70 mil japoneses na idade entre 15 a 39 anos, segundo o Ministério da Saúde no Japão, se caracteriza por pessoas que tem um comportamento de extremo isolamento social, passando a maior parte do dia trancados em seu quarto, isolados do mundo e sem perspectivas de vida.
Este tipo de comportamento leva a pessoa a evitar a todo custo, o contato com outras pessoas. É verdade, que os “Hikikomoris” (引きこもり) sempre existiram e não estão restritos somente à terra do sol nascente, mas nota-se que podem ser mais facilmente encontrados em países desenvolvidos e em famílias de classe média ou alta.
No Japão, a proporção desse fenômeno é de fato alarmante. Os jovens de hoje em dia foram em sua maioria criados em meio a muito conforto e tecnologia, porém sem o estímulo necessário para que tivessem uma vida social saudável, o que contribuiu para que muitos desses indivíduos acabassem com medo de enfrentar o mundo.
Quem criou este termo foi o psicólogo Saito Tamaki e como é um grande estudioso no assunto, ele afirma que os dados fornecidos pelo Ministério da Saúde no Japão estão muito abaixo da realidade. Para o psicólogo, de 1 a 3 milhões de jovens do sexo masculino sofrem deste comportamento de extrema exclusão e isolamento social. Um número absurdo não acha?
Segundo Saito Tamaki, as causas desse fenômeno no Japão ocorre devido ao padrão de perfeição exigida pela sociedade, acarretando vários problemas como baixa auto-estima e até graves transtornos sociopáticos.
Portanto, o comportamento de um Hikikomori vai muito além do cara ser simplesmente um ser “anti-social”.
Pode estar ligado diversos problemas, entre eles a timidez excessiva, depressão, ansiedade, síndrome do pânico, bipolaridade, personalidade esquizoide, entre outros transtornos. E além da pressão exercida por uma sociedade rígida, existem outras causas que podem dar origem ou agravar o problema de isolamento social.
O ijime (bullying) por exemplo, acontece com frequência durante a vida escolar ou no trabalho e pode fazer com que o indivíduo acabe se decepcionando com a sociedade como um todo, gerando um afastamento radical do convívio social com outras pessoas que o cercam, incluindo amigos de longa data e familiares.
Vivendo dentro de uma concha
Como é de se esperar, esse problema causa uma grande preocupação, afinal atinge uma grande parcela da população masculina. Além de serem vistos como improdutivos, sem qualquer ambição profissional, os Hikikomoris, assim como ocorre com os Homens Herbívoros, afastam qualquer tipo de relacionamento amoroso concreto, que possa resultar em casamento e uma ninhada de filhos.
Como sabemos a baixa taxa de natalidade é outro problema grave que o Japão enfrenta. Além disso, a falta de interesse em alcançar o sucesso profissional mostra que o problema atinge não só o indivíduo e sua família como também afeta o desenvolvimento econômico de um país inteiro, ainda mais se tratando do Japão que é considerada a 3° maior potência econômica do mundo.
Este é mais um exemplo de que o Japão é um país de contrastes, pois ao contrário do Karoshi, que se caracteriza por homens que valorizam o trabalho ao extremo, chegando até a pagar este preço com a própria vida, o Hikikomori se caracteriza por pessoas que não conseguem se fixar em nenhum emprego.
Outra característica do Hikikomori, sem generalizar, é que a maioria deles são muito desorganizados, não se preocupam com a aparência e nem com a higiene. Acabam vivendo como ermitões solitários imersos dentro da sua própria ilha.
Muitos deles chegam aos 40 anos de idade ainda dependentes financeiramente de sua família. Com certeza, é uma situação muito triste, capaz de desestruturar uma família inteira. Não são pessoas que não trabalham por “vagabundagem” e sim porque realmente existe um bloqueio que os impede de ter uma vida social saudável.
Muitos até sentem vontade de mudar, de dar uma reviravolta na situação, mas não conseguem ou não tem autoestima suficiente para aproveitar as oportunidades que a vida oferece. Ao invés disso, preferem viver dentro de sua própria concha, como forma de se proteger do mundo “cruel” e “real” que fica do lado de fora.
Também é normal relacionar o Hikikomori com a Cultura Otaku, já que possuem alguns pontos em comum, como a vida solitária e o interesse em tudo que é relacionado à mangás, animes e jogos de videogames. Mas isso não é uma regra, pois há muitos casos de Hikikomoris que possuem outros tipos de interesse.
Curiosidade: O termo NEET é como chamam o Hikikomori em inglês. O termo nasceu no Reino Unido, mas seu conceito acabou se espalhando e se popularizando em outros países, incluindo Japão, China e Coréia do Sul.
Programa de assistência aos Hikikomori
Preocupados com o futuro do Japão, desde 2007, o governo japonês tem implantado um programa assistencial aos Hikikomori. As “Super Irmãs”, nome dado às assistentes sociais, interagem com estes homens através de cartas e telefonemas, estimulando-os gradualmente a terem mais contato social.
Por serem do “sexo feminino” a aceitação é melhor e muitos acabam aceitando convites para ir ao cinema, praças, shoppings e a participar de atividades sociais, culturais e esportivas. Ter uma pessoa dando apoio constante é fundamental para que os “hikikomori” consigam melhorar seu isolamento e reclusão social.
Tem um anime chamado NHK ni Youkoso, que aborda um pouco sobre assunto, embora de uma forma mais leve e divertida. A história gira em torno de Tatsuhiro Sato, um jovem de 21 anos, desempregado que abandonou a faculdade e acabou se tornando um Hikikomori (veja o primeiro capítulo legendado no Youtube). Tem outro anime chamado Sayonara Zetsubou Sensei que aborda este tema.
Fonte: Japão em Foco