Conheça a lenda de Shisa, a estátua meio leão, meio cachorro que decora os telhados em Okinawa, protegendo seus habitantes dos maus espíritos
Se você visitar as ilhas Ryukyu, certamente encontrará estátuas Shisa (シーサー) por toda parte. Esta figura mitológica meio cachorro, meio leão, é parte integrante da cultura de Okinawa, uma das oito províncias de Kyushu, e uma das três maiores ilhas do Japão.
Estátuas Shisa, também conhecidas como Shi-Shi (獅子), cujo significado é “leão” no idioma local, são amplamente encontradas sobre os telhados das casas ou posicionadas em frente aos estabelecimentos corporativos assim como órgãos públicos como escolas e hospitais.
Segundo os moradores de Okinawa, estátuas Shisa oferecem proteção e afastam os maus espíritos. Originalmente eram usadas como guardiões de residências e santuários xintoístas mas hoje podem ser vistos por toda parte. Alguns Shisa possuem uma pata colocada sobre uma esfera dourada, simbolizando sorte, bondade, riqueza e colheitas abundantes.
Dizem que estátuas Shisa foram importadas da China para o arquipélago por volta do século XV. Hoje em dia podem ser encontradas em vários tamanhos, cores e formas. Em muitos lugares encontraremos duas estátuas Shisa, uma com a boca aberta (macho) para afastar os maus espíritos e a outra com a boca fechada (fêmea) para manter os bons espíritos.
A lenda de Shisa e o Dragão do Mar
Tal como acontece com a maioria das criaturas japonesas, existem muitos contos e folclore em torno do Shisa. A principal, no entanto, fala sobre um monstruoso dragão marinho que aterrorizava os moradores do vilarejo de Madanbashi, uma aldeia ao sul de Naha.
Tudo começou com um colar decorado com uma figura de Shisa que foi dada a um rei no Castelo de Shuri por um emissário chinês. Quando esse mesmo rei visitou Madanbashi, o dragão iniciou um infame ataque. Aterrorizados, todos os aldeões fugiram para se esconder.
Foi então que uma sacerdotisa local recordou um sonho que teve recentemente. No sonho, o rei deveria confrontar o dragão com a estátua de Shisa erguida em direção a ele. Ela chamou um menino chamado Chiga, e pediu para que ele entregasse a mensagem ao rei.
Assim fez o rei. Ao chegar na praia, o rei ergueu a estátua Shisa diante do monstro. A estátua ganhou vida e rugiu como um leão, um rugido tão alto e poderoso que fez estremecer o próprio dragão. O rugido fez com que uma grande rocha caísse do céu sobre o dragão, matando-o.
Com o tempo, a rocha e o corpo do dragão foram ficando cobertos de árvores e plantas, se transformando no que antigamente era o bosque de Ghana-Mui (ガーナー森), uma pequena ilha coberta por vegetação que hoje faz parte da cidade de Naha, em Okinawa.
Os aldeões de Madanbashi construíram uma grande estátua shisa de pedra para protegê-los e assim a aldeia nunca mais foi incomodada por nenhum outro dragão. A notícia se espalhou e outras aldeias passaram também a colocar estátuas Shisa como forma de proteção.
O shiisa de Madanbashi compõe-se de dois corpos, Irinu Shiisa e Agarinu Shiisa. Até hoje, os habitantes de Madanbashi se reúnem no dia 15 de agosto para oferecer orações e oferendas (principalmente frutas) às estátuas de Iri-nu, protetor das florestas.
Shisa e Komainu: O conto de dois cães-leões
Como dissemos anteriormente, as estátuas Shisa de Okinawa foram influenciadas pelas estátuas Shishi da China. No entanto, existe outra variação de estátuas Shisa importada da Coreia que é popular no Japão continental chamada de “Komainu” (狛犬).
Ambos são usados para proteger contra os maus espíritos. Então quais são as diferenças entre esses dois guardiões japoneses, Shisa e Komainu? Bem, Shisa faz parte da cultura de Okinawa, muito antes de 1879, época em que esta ilha acabou sendo incorporada ao Japão.
Por este motivo, raramente é encontrado em outras áreas do Japão. Já as estátuas Komainu podem ser encontradas no Japão continental, especialmente em frente a santuários xintoístas, templos budistas, jardins ou até mesmo protegendo casas da nobreza japonesa.
Mas e quanto ao Shisa? Por que é colocado nos telhados das casas? Bom, os moradores de Okinawa acreditam que Shisa proteja a casa de acidentes naturais. Em Okinawa há muita ocorrência de tufões, o que explica a estrutura das casas serem de pedra e concreto, com telhado afixado nas paredes e janelas bem protegidas, diferente do resto do Japão.
Shisa também é conhecido por combater incêndios. Muito tempos atrás, o vilarejo Tomori era atormentado por numerosos incêndios e os moradores da aldeia procuraram por Saionzui, um mestre do Feng Shui, para perguntar-lhe por que tal desastre atingia sua cidade.
Ele disse que o responsável era o Monte Yaese, que ficava próximo à vila e sugeriu que todos construíssem uma gigantesca estátua shisa de pedra para protege-los. Seguindo o seu conselho, os aldeãos construíram a estátua e desde então ficaram protegidos do fogo.
Shisa Na Cultura Popular
Por ser uma figura popular na cultura de Okinawa, Shisa transformou-se em personagem de diversas mídias, de séries de TV aos videogames, como o demônio Shiisaa dos jogos Shin Megami Tensei; este demônio é baseado exatamente no Shisa, incluindo a aparência.
Dizem que Arcanine da franquia Pokemon também foi inspirado nos leões guardiões de Okinawa, assim como Seasarmon, uma criatura de Digimon. Podemos citar também King Caesar, do filme da franquia Godzilla: Godzilla vs. Mechagodzilla de 1974.
Enfim, se você já foi para Okinawa, deve ter visto muito Shisa em suas caminhadas pela ilha e deve ter se perguntado sobre a história dessa criatura tão excêntrica e especial para o povo okinawano. Espero que este artigo tenha ajudado a elucidar suas dúvidas.
Fonte: Japão em Foco