Escolas de seis localidades no Japão serão palco de uma pesquisa que vai investigar as taxas de alunos brasileiros diagnosticados como autistas e enviados para classes especiais.
O projeto, divulgado no final de outubro é do Instituto para a Engenharia do Futuro (Ifeng), um dos principais centros de pesquisa em política pública do Japão.
A necessidade de um levantamento vinha sendo discutida com o Ministério da Educação do Japão pela Embaixada do Brasil havia dois anos, quando dados extraoficiais indicaram que a porcentagem de brasileiros identificados como autistas no sistema de ensino japonês era o triplo da de japoneses.
Segundo levantamentos feitos por organizações não governamentais, são 6% os filhos de decasséguis diagnosticados como autistas pelo sistema de ensino japonês, enquanto a taxa é de 2% entre os japoneses (na média global, segundo a Organização Mundial de Saúde, 0,62% das crianças recebem esse diagnóstico). No Japão, o aluno diagnosticado como autista é encaminhado para salas especiais e nunca mais consegue se reintegrar no ensino regular, o que afeta seu futuro para sempre.
Havia dificuldades burocráticas, no entanto, para atacar o problema: como o ensino não é obrigatório para crianças estrangeiras, o governo federal japonês não tem estatísticas centralizadas.
Por isso, os pesquisadores vão centrar esforços nos dados municipais, em regiões com presença importante de filhos de decasséguis. Além de números, o estudo vai mapear como é feito o diagnóstico e como é o ensino nas classes especiais.
Foram escolhidas quatro cidades industriais com mais de 5.000 brasileiros -Hamamatsu (em Shizuoka), Toyohashi e Toyota (em Aichi) e Oizumi (Gunma)- e duas nas quais a industrialização recente fez a porcentagem de brasileiros crescer rapidamente -Echizen (Fukui), Izumo (Shimane).
O trabalho também vai comparar os dados desses locais com os de Minato, em Tóquio, que concentra imigrantes brasileiros de maior escolaridade.
Pelo cronograma proposto, os resultados sairiam no segundo semestre do ano que vem. O custo previsto, de 6,2 milhões de ienes (cerca de R$ 205 mil), será bancado com recursos do governo brasileiro, de comunidades brasileiras no Japão e de entidades como a Associação das Damas Latino-Americanas.
A embaixada liderou a negociação com o Ministério da Educação do Japão, mas o levantamento será coordenado pela Sabja (Serviço de Assistência aos Brasileiros no Japão), organização não governamental que dá apoio psicológico e orientações a decasséguis, “para garantir credibilidade acadêmica e independência”, segundo o embaixador André Corrêa do Lago.
Com os resultados na mão, “começa uma nova etapa de interlocução entre a comunidade brasileira e o governo japonês, baseada em informação de qualidade”, diz Corrêa do Lago.
“Não adianta ficar só reclamando e citando problemas sem se basear em um estudo aprofundado.”
Para Michie Afuso, diretora da ABC Japan, que dá apoio à comunidade brasileira em Yokohama, um dos principais obstáculos para os filhos de decasséguis é a dificuldade de comunicação dos pais (que muitas vezes não dominam o idioma) com a escola.
Com o apoio do governo de Kanagawa, a entidade procura facilitar essa comunicação para reduzir a evasão escolar e facilitar a volta das crianças à escola.
Outra tática para aumentar as chances de sucesso dos alunos brasileiros é que escolas brasileiras no Japão deem aulas de reforço, sugere trabalho encomendado pela embaixada ao pesquisador da UnB Maurício Soares Bugarin, que estuda de perto questões educacionais japonesas desde 2009.
“Isso não só potencializa a adaptação dos alunos brasileiros às escolas japonesas. Também os ajuda a manter a brasilidade. Abre um caminho para que os brasileiros repitam no Japão o que os japoneses fizeram no Brasil: integrar-se mantendo suas especifidades culturais”, diz o embaixador Corrêa do Lago.