Em muitas partes do Japão, o inverno significa temperaturas abaixo de zero, ventos gélidos e neve. Apesar disso, a maioria das casas japonesas não tem aquecimento central, como em outros países com rigoroso inverno. Então, como as pessoas se mantêm aquecidas?
Muito simples! Reunindo-se ao redor do kotatsu (炬燵), uma mesa aquecida que se tornou imprescindível em muitas casas japonesas durante os meses de inverno. Trata-se de uma mesa baixa com um aquecedor elétrico fixado na parte de baixo e dois cobertores de futon, um mais fino usado como uma espécie de tapete e outro mais grosso, preso às laterais da mesa.
Geralmente é colocado sobre o tatami, o que significa que você pode se sentar no chão, colocar as pernas e os pés embaixo da mesa e cobrir parte do seu corpo com o futon. A sensação é tão boa, que quando se der conta, vai estar somente com a cabeça pra fora!
Não é a toa que os amantes de kotatsu são chamados de “kotatsumuri”, um trocadilho que resultou da união das palavras Kotatsu e Katatsumuri (caracol). A razão é que as pessoas envolvidas pelo calor agradável do kotatsu se enrolam embaixo dele como caracóis.
Um pouco da história do kotatsu
As origens do kotatsu datam do século XIV, a partir de assentos adicionados ao Irori (queimadores de carvão usados para cozinhar). Esse tipo de mesa sobre uma plataforma é chamado de Horigotatsu, no entanto são raramente encontrados hoje em dia.
A vantagem do Horigotatsu é o fato de fornecer uma postura confortável para se sentar já que as pernas ficam livres sob a plataforma. Outro tipo de kotatsu que surgiu nessa época é o Okigotatsu, que é a mesa baixa aquecida com carvão e colocada sobre o chão.
Okigotatsu, apesar da vantagem de ser portátil, obriga as pessoas a se sentarem na posição seiza por longos períodos, o que pode ser um grande desafio especialmente para os ocidentais. No início do século 20, o aquecimento à carvão foi sendo substituído aos poucos pela eletricidade especialmente devido ao medo de intoxicação por monóxido de carbono.
Atualmente, o Kotatsu ganhou contornos modernos. O tipo mais usado é aquele usado sobre o piso ou tatame. Acaba servindo como uma espécie de aquecimento local, na falta de um central. Como forma de reduzir os gastos com energia elétrica, os membros de uma família costumam se reunir em volta dele para fazer atividades comuns a todas as famílias.
No Japão, podemos encontrar Kotatsu a preços que se adequam a todos os bolsos. Os preços começam em ¥2.000 (só a mesa), mas no geral, custam em torno de ¥8000 a ¥12.000 para um conjunto completo, incluindo aquecedor, tampo de mesa, colcha e tapete.
Hoje em dia podemos encontrar até modelos mais funcionais de Kotasu, como o Charisma, vendido na varejista online Rakuten. Este modelo oferece um espaço de armazenamento para guardar laptop, tablet, revistas e mangás, além de outros objetos pessoais.
Como usar o kotatsu?
Para usar o Kotatsu é muito simples, basta estender o futon sob a mesa (shitagake) e cobri-la com um segundo futon mais pesado (kotatsugake). Em seguida, sentar-se no chão, em almofadas zabuton ou cadeiras chamadas zaisu, com as pernas estendidas sob a mesa. No verão, o futon pode ser removido, e o kotatsu pode ser utilizado como uma mesa normal.
O Kotatsu tornou-se um item que propicia a socialização de uma família, onde todos se sentam em volta dele nos dias frios para assistir TV, tomar um chá, comer mikan (tangerina japonesa) e bater um papo. Tornou-se um símbolo de felicidade e união familiar.
Gatos amam Kotatsu
Os gatos são muito sensíveis ao frio e a maioria deles adoram dormir sob kotatsu. Como são pequenos, eles conseguem se acomodar perfeitamente, assim como diz a letra de uma canção infantil: “neko wa kotatsu de maruku naru” (gato enrolado no kotatsu).
Por falar em dormir, não é aconselhável dormir sob o kotatsu embora muitas pessoas o façam. Tirar um cochilo até vai, mas dormir durante a noite não é bom pois o corpo não fica completamente coberto, o que acaba produzindo um aquecimento desigual. Além disso, pode-se acidentalmente tocar na estrutura de aquecimento o que pode causar queimaduras.
O kotatsu vem caindo em desuso
Nos últimos anos, as vendas de kotatsu vem caindo se compararmos 40 anos atrás. Eles vem sendo substituídos pelo ar condicionado ou por um sistema de aquecimento nos pisos em apartamentos mais modernos. O ar-condicionado por exemplo, começou a se popularizar na década de 1970, e hoje está presente em 90,5% das residências japonesas.
No entanto, o kotatsu consome metade da energia do ar condicionado, o que vem fazendo com que as pessoas optem em usar o kotatsu novamente. Isso se deu especialmente após o Grande Terremoto de 2011, com o aumento da conscientização sobre economia de energia.
Vale lembrar também que muitos apartamentos japoneses são extremamente pequenos, o que muitas vezes inviabiliza o uso do kotatsu. Nesses casos, é preciso optar entre um kotatsu e um outro móvel, como um sofá – poucas casas têm espaço para ambos. Mas o kotatsu ainda é a opção preferida para aqueles que querem preservar um estilo de vida mais tradicional.
Kotatsu ao ar livre e Trens Kotatsu
Os benefícios do kotatsu tem sido reavaliados, bem como sua capacidade de aproximar as pessoas. Com isso, tem surgido iniciativas como a do Bane Bagus, um restaurante localizado no badalado bairro de Akasaka Mutsuke, em Tóquio, que resolveu trocar as mesas e cadeiras convencionais de uma parte do seu terraço ao ar livre por tatami e kotatsus.
Outro exemplo é o “Kotatsu Train“, operado empresa Sanriku Railway que faz uma rota entre as cidades de Kuji e Tanohata (50 km a leste de Morioka), situadas na província de Iwate. Seus vagões são equipados com 12 confortáveis kotatsu para que os passageiros possam apreciar a paisagem como se estivessem no conforto da sala de suas casas. Incrível né?
A empresa ainda disponibiliza para os passageiros comerem durante a viagem, três obentôs especiais com ingredientes locais de dar água na boca . O valor do bilhete de trem de Kuji à Miyako (ida) custa 1850 ienes. Já o obento custa entre 1200 e 1700 ienes.
Os passageiros também poderão experimentar um pouco do folclore local enquanto viajam: Dois demônios Namahage invadem o vagão. Eles são conhecidos por visitar as casas dos vilarejos na véspera de Ano Novo à procura de crianças preguiçosas e mal comportadas.
Fonte: Japão em Foco