Em 1877, surgiu o primeiro dispositivo de produção de eletricidade via energia solar, precursor do painéis que hoje representam um dos baluartes da chamada energia limpa. Porém, uma análise mais profunda começa a revelar que, talvez, nem mesmo ela esteja livre de poluir o meio ambiente.
A cadeia de produção de células para a captação de energia solar começa com seu fabrico a partir do quartzo, a forma mais comum de sílica. Ele é primeiro convertido em silício de grau metalúrgico e, depois, refinado e transformado em polissilício, gerando um resíduo altamente tóxico: o tetracloreto de silício que, se exposto à água, libera ácido clorídrico, o que acidifica o solo e emite gases nocivos.
Em meados da década passada, poucos países tinham regulamentações rígidas sobre armazenamento e descarte de resíduos. A China não era uma exceção. O país foi palco de dois grandes vazamentos; em 2008, uma empresa descartava o material em campos vizinhos, deixando-os inutilizáveis para cultivo, além de provocar inflamações nos olhos e garganta dos moradores.
O outro caso se deu em 2011. Mesmo com a China exigindo que as empresas reciclassem ao menos 98,5% de seus resíduos, uma das maiores empresas fotovoltaicas do mundo derramou ácido fluorídrico em um rio, matando milhares de peixes e centenas de porcos.
Captar a energia solar sem sujar o meio ambiente
Embora mais de 90% dos painéis para captação da energia solar fabricados hoje comecem com polissilício, existe uma abordagem mais recente: a tecnologia de células solares de camada fina, mais baratas de fabricar, usando menos energia e material. O processo consiste em depositar um material semicondutor de energia solar diretamente sobre um substrato de vidro, metal ou plástico.
Dois materiais são usados; um deles é o telúrio de cádmio, um metal pesado que é cancerígeno e genotóxico, o que significa que pode causar mutações hereditárias. Existem poucas informações sobre a exposição a trabalhadores ao cádmio nos estágios iniciais do ciclo de vida do metal, quando ele é extraído das minas de zinco. A exposiçõe ao metal após o descarte dos painéis solares também é preocupante. Nem todos os consumidores têm acesso a um programa de devolução gratuita, e muitos desconhecem a necessidade de descartar os painéis de maneira responsável.
A toxicidade não é a única preocupação. Produzir células solares requer muita energia, expressa em quilogramas de CO2 emitidos por quilowatt-hora gerado. Segundo pesquisadores do Laboratório Nacional de Argonne e da Universidade Northwestern (ambos nos EUA), a pegada de carbono dos painéis fabricados na China é quase o dobro da pegada dos fabricados na Europa.
A água é outra questão; os fabricantes usam uma grande quantidade para refrigeração, processos químicos e controle de poluição do ar. No entanto, o maior desperdício ocorre durante a limpeza na instalação e no uso dos painéis. Projetos em escala comercial de 230 a 550 megawatts podem exigir até 1,5 bilhão de litros de água para controlar a poeira durante a instalação dos painéis e outros 26 milhões de litros por ano para lavar os que estão em operação.
O setor de energia solar não possui rótulo ecológico oficial. Pesquisadores do Centro Nacional de Pesquisa Ambiental Fotovoltaica do Laboratório Nacional Brookhaven em Upton, Nova York (EUA), há muito tempo publicam estudos sobre os possíveis riscos ambientais de células e painéis. Com a crescente preocupação em diminuir e até eliminar riscos ambientais que o fabrico e uso de painéis solares podem trazer, essa indústria poderá ser um dia verdadeiramente verde.