Imagine descobrir que todas as pessoas com quem você convive não passam de atores e atrizes, que sua vida é gravada 24 horas por dia por câmeras escondidas e que você é, na verdade, a estrela principal de um reality show que é exibido para todo o mundo sem sua permissão. É isso o que acontece com Truman Burbank em “O Show de Truman”, comédia dramática de 1998 estrelada por Jim Carrey. Longe da ficção, indivíduos com a síndrome de Truman acreditam que suas vidas fazem parte de um imenso programa de televisão, tal qual a do personagem do clássico que dá nome ao distúrbio.
O delírio do Show de Truman foi relatado formalmente pela primeira vez em 2008, em um estudo realizado pelos irmãos Joel e Ian Gold, psiquiatra e neurofilósofo, respectivamente. Tudo começou quando um paciente procurou Joel Gold para compartilhar sua suspeita de que sua vida estava sendo secretamente filmada e transmitida ao mundo. O homem comparou o que sofria com o filme — referência que foi citada ao médico por outros pacientes com dilemas similares ao longo dos anos.
Na primeira pesquisa dos irmãos Gold, os estudiosos citam cinco casos de pessoas diagnosticadas com a disfunção; três delas fizeram menção ao filme dos anos de 1990. Desde então, os pesquisadores já estudaram mais de 100 casos de indivíduos que experimentam a vivência de Truman na pele (ou pelo menos em suas mentes). Quem sofre com o delírio vive com a sensação de que há um diretor fora do campo de visão que está guiando todas as cenas da sua vida.
Enquanto algumas pessoas se orgulham da fama imaginária, outras vivem profundamente perturbadas com o que parece uma total invasão de privacidade. Uma publicação do British Journal of Psychiatry relatou o caso de um homem diagnosticado com a disfunção atrelada à esquizofrenia que é incapaz de trabalhar. Em um caso ainda mais grave, um dos pacientes de Gold planejava cometer suicídio se não conseguisse deixar o suposto reality show.
Apesar de ter ficado conhecido como síndrome de Truman, o comportamento não é oficialmente reconhecido e listado como uma síndrome por entidades médicas. O que os especialistas observam é que esse delírio está frequentemente vinculado a outros distúrbios psiquiátricos, como esquizofrenia e bipolaridade. Cientistas acreditam que a cultura em que estamos inseridos — e o modo como nos relacionamos com a tecnologia — pode ter influência significativa no transtorno.
Com tantas câmeras de vigilância e smartphones em nosso cotidiano, não é de se espantar que alguém ache que está sendo observado o tempo todo. O problema de quem sofre com a disfunção é acreditar que essas imagens estão sendo exibidas para milhões de pessoas, além da paranoia constante.