Antes de nos rirmos da promessa aparentemente fútil que Marie Kondo faz ao público – a de ensinar a arrumar a casa –, lembremo-nos que a revista Time a elegeu como uma das 100 pessoas mais influentes do planeta. E isto em 2015, muito antes de terem chegado ao conhecimento de todos nós os vídeos em que ensina a dobrar roupa e a arrumá-la numa gaveta ou numa caixa, de forma a identificar cada peça à primeira vista, ou em que sugere que se guarde apenas os objetos que despertem “uma faísca de alegria” e por isso tragam felicidade. E muito antes, evidentemente, de ter o seu próprio programa na plataforma de streaming Netflix (intitulado A Magia da Arrumação), mas já depois de ter vendido milhões de livros em que ensina o método KonMari (Arrume a Sua Casa, Arrume a Sua Vida, é o mais popular), que ganhou uma legião de adeptos.
E em que consiste esse método? Já mencionámos a dobragem da roupa e a manutenção de peças que deem felicidade. Depois, é vencer a preguiça e o hábito de procrastinar e fazer uma arrumação a fundo: tirar tudo do sítio, escolhendo uma categoria de objetos de cada vez (roupa, papéis, loiças, etc.), deitar fora ou doar tudo o que realmente não faz falta e colocar cada coisa num local apropriado, deixando à mão o que se usa mais e fora de alcance o que raramente é útil. Dito assim, parece óbvio, mas se realmente o fosse não estaria a render uma fortuna à mentora da ideia, um caso sério de popularidade, ainda que proporcione muitos comentários humorísticos e piadas, sobretudo pelo hábito que tem de agradecer às casas antes de proceder à sua organização.
Embora isso nos pareça risível, não o será no Japão, onde uma cultura mais espiritual não considera ridículo atribuir uma espécie de alma aos objetos. Talvez não seja assim tão diferente do valor sentimental que por vezes nos despertam as peças de uso corrente… E o facto é que o mundo ocidental, e os americanos em particular, parece precisar dela. Por isso esta japonesa, nascida em Tóquio a 9 de outubro de 1984, casada com o também japonês Takumi Kawahara (que trabalhava em vendas e marketing no Japão antes de se tornar agente da mulher e CEO da empresa) e mãe de duas filhas, Satsuki, de três anos, e Miko, de dois, se mudou de armas e bagagens para os Estados Unidos, primeiro para São Francisco, depois para Los Angeles, na Califórnia, como qualquer estrela que se preze. E é aí que tem feito uma espécie de carreira artística enquanto guru da arrumação.
Uma vocação que, conta a própria, surgiu na infância: todos os resumos biográficos de Marie Kondo reproduzem a história de como, em criança, preferia aproveitar os intervalos escolares para arrumar prateleiras de livros na sala de aulas a juntar-se aos colegas no recreio e que um dia sofreu uma espécie de ataque nervoso que a fez desmaiar e assim permanecer durante duas horas. Conta ela que, quando recuperou a consciência, ouviu como que uma voz a dizer-lhe que deveria olhar com mais atenção para as coisas. “Dei-me conta do meu erro”, explica. “Apenas procurava coisas para deitar fora quando deveria encontrar coisas que queria guardar. Identificar as coisas que me fazem feliz, essa é a arte de arrumar.” E foi este lema de vida que acabou por a conduzir ao sucesso.