Há uma discussão polêmica rolando no universo científico — e não é à toa. O Pentágono, sede do Departamento de Defesa dos Estados Unidos, anunciou recentemente que está trabalhando em um projeto bastante inusitado em parceria com a Agência de Pesquisas e Projetos de Defesa Avançada (DARPA). Batizada de “Insect Allies”, a ideia consiste em contaminar insetos com vírus “do bem” para proteger as plantações do país.
Utilizando diversas técnicas de edição de genes, a agência pretende infectar propositalmente pequenos afídeos (conhecidos popularmente como pulgões) com vírus modificados para tornar as colheitas mais produtivas. No caso de uma seca, por exemplo, seria possível espalhar os insetos nos campos para que vírus geneticamente modificados reduzam a taxa de crescimento das plantas.
Uma das tecnologias utilizadas para atingir esse objetivo seria a CRISPR (Clustered Regularly Interspaced Short Palindromic Repeats ou Repetições Palindrômicas Curtas Agrupadas e Regularmente Interespaçadas), uma ferramenta de edição de genoma que já foi testado inclusive em embriões humanos. Tal técnica foi originalmente criada para evitar doenças e mutações genéticas, mas suas áreas de atuação são amplas.
A DARPA comenta ainda que esse tipo de “terapia” afetaria apenas um ciclo de colheita, protegendo as plantações americanas de “ameaças” como pragas, enchentes e geadas. Os vírus feitos em laboratórios seriam, naturalmente, inofensivos aos seres humanos. Porém, mesmo com tanta boa vontade das autoridades estadunidenses, alguns especialistas ainda estão com uma pulga — ou melhor, um pulgão — atrás da orelha.
Tem algo estranho aí
Não é necessário ser paranoico para imaginar um cenário no qual esse tipo de técnica seja utilizada para fins malignos. Em uma carta aberta publicada no jornal Science, uma equipe de cinco cientistas falaram sobre suas preocupações a respeito do projeto, que poderia muito bem se transformar em uma arma biológica em um futuro próximo — bastaria criar um vírus nocivo aos seres humanos e espalhar os insetos em áreas urbanas.
Aliás, o simples ato de espalhar um vírus nocivo em plantações de países inimigos já seria o suficiente para causar um estrago dos grandes. “Na nossa opinião, as justificativas não são claras o suficiente. Porque usar insetos? Eles poderiam usar sistemas de spray”, argumenta Silja Voeneky, um dos autores do manifesto e professor da Universidade de Friburgo, na Alemanha.
Para Blake Bextine, responsável pelo Insects Allies, é natural que novas tecnologias como essa sejam motivos de preocupações em relação ao seu uso ético; ele também concordou que esse tipo de projeto poderia ser usado de forma ofensiva. “Não é isso que estamos fazendo. Estamos entregando características positivas às plantas. Queremos garantir a segurança da alimentação, que consideramos parte da segurança nacional”.
Embora o Insect Allies esteja em suas fases iniciais de desenvolvimento, pelo menos quatro universidades norte-americanas já receberam dinheiro para participar das pesquisas. Como um teste, Bextine afirma que sua equipe já conseguiu usar um afídeo com um vírus que causa fluorescência. Acredite ou não, mas o milho, que foi usado como “vítima” para o piloto, realmente ganhou capacidades bioluminescentes. Assustador, não é mesmo?